SEGURANÇA PÚBLICA
Reações enérgicas das forças policiais
contra grupos reduzidos de manifestantes que tentam se aproximar de estádios
vêm marcando a maior parte das manifestações ocorridas desde o início da Copa
do Mundo.
Para analistas ouvidos pela BBC Brasil,
com essa estratégia, as autoridades brasileiras tentam evitar publicidade
internacional negativa, mas podem acabar ferindo o direito de manifestação da
população.
Em capitais como São Paulo e Belo
Horizonte, pequenos grupos de manifestantes foram dispersados desde o início do
Mundial com gás lacrimogêneo e balas de borracha por numerosos contingentes
policiais - antes mesmo de conseguirem se concentrar para marchar em direção
aos estádios.
Essas ações policiais vêm sendo
bastante criticadas por organizações não governamentais, como ONG de defesa de
direitos humanos Anistia Internacional, que acusa a política de uso excessivo
de força durante a Copa.
Já os governos defendem suas ações
principalmente com os argumentos de impedir vandalismo por parte de grupos
manifestantes radicais e evitar que importantes vias das cidades usadas na Copa
do Mundo sejam bloqueadas. As autoridades dizem que o direito de manifestação
não está sendo impedido.
Segundo os analistas, essa estratégia
da polícia deve continuar sendo adotada por ora, pelo menos enquanto não
ocorrer um erro policial ou ocorrência grave em um protesto, ou até após as
eleições, quando os eleitos poderão tomar as decisões políticas necessárias
para atender as demandas das ruas.
Impedir concentrações
Até agora, as manifestações com
centenas de milhares de pessoas que marcaram o ano passado não têm se repetido
durante o Mundial. O embate de estratégias de manifestantes e de autoridades tem
gerado polêmica internamente, porém baixa repercussão fora do Brasil - onde as
notícias esportivas relacionadas ao Mundial têm ganho muito mais destaque.
De acordo com a Anistia Internacional,
diferente do que ocorria antes do início do mundial, forças policiais
brasileiras não estão permitindo que manifestantes sequer se concentrem para
iniciar protestos. Especialmente se o objetivo é se aproximar de estádios.
"Estão restringindo o direito e a liberdade das pessoas de se
manifestarem pacificamente", segundo Renata Neder, assessora de direitos
humanos da Anistia Internacional Brasil.
Segundo ela, a organização investiga
casos com essas características em São Paulo e Belo Horizonte. Na capital
paulista, essa tática teria sido usada no último dia 12 - quando manifestante
teriam tentado fechar uma das principais vias de acesso à Arena Corinthians na
abertura do Mundial.
A Anistia diz que um grande contingente
policial usou armamentos não letais contra um grupo pouco numeroso.
A reportagem da BBC Brasil estava no
local e constatou que, pelo menos no início da ação, foi usada uma quantidade
maior de balas de borracha em relação ao que vinha sendo empregado em protestos
anteriores. A presença de policiais a cavalo também foi um elemento novo.
Imagens de uma TV local também mostraram um homem ser atingido por gás
de pimenta mesmo depois de dominado por policiais.
O comandante da Polícia Militar
paulista Benedito Roberto Meira disse na ocasião que o uso de balas de borracha
faz parte dessas ações e quem deve mudar de postura "são os
manifestantes".
O secretário de Segurança de São Paulo,
Fernando Grella, negou que o direito de manifestação tenha sido cerceado. Ele
disse que esse direito deve ser balanceado com o direito de ir e vir -
referindo-se à intenção dos manifestantes de bloquear a avenida Radial Leste.
Segundo a Anistia, em Belo Horizonte no
último dia 14, a polícia teria impedido parte dos manifestantes de chegar ao local
escolhido para o protesto.
O secretário de Defesa Social de Minas
Gerais, Rômulo de Carvalho Ferraz, disse à BBC Brasil que a tática usada na
cidade foi confinar os manifestantes em um espaço físico limitado para evitar
depredações. Ele disse porém que os manifestantes ficaram livres para entrar ou
sair individulamente desse espaço. "Não adotamos postura para impedir
manifestação", disse.
Episódios de manifestantes dispersados
enquanto se dirigiam ao local de protesto também ocorreram em outras capitais,
embora tenham sido menos debatidos.
Além de investigar esses casos, a
Anistia está investindo em campanhas sobre temas relacionados, como pela
presença de defensores públicos dentro de estádios e a regulamentação federal
do uso das armas não letais.
Equilíbrio
Para o analista de segurança
internacional Peter Tarlow, autor do livro Tourism Security ("Segurança do
Turismo", sem versão em português), o Brasil precisa encontrar um
equilíbrio entre as demandas nacionais e os objetivos internacionais com a
Copa.
"O (governo do) Brasil não pode tolerar desordem ou bagunça. Eles
(os governos) precisam ter uma mão firme para não permitir má publicidade
(internacional)" , disse Tarlow.
"Agora, do ponto de vista das pessoas que moram lá (no Brasil), é
uma situação muito difícil, porque eles estão perdendo seu direito de
protestar."
"Se eu fosse um brasileiro não gostaria de ver a polícia usando a
força", completou.
Mas ele acha que se a polícia não
continuar adotando ações enérgicas, em teoria a tendência é que os protestos
cresçam.
Ele disse também que as ações podem ser
fortes, mas abusos de policiais não podem ser permitidos.
"Geralmente quando a polícia não mostra a capacidade de manter a
ordem, então as manifestações podem crescer, não diminuir, mas pelo menos o que
temos até o momento é que as manifestações têm sido pequenas (no Brasil)”,
disse.
Postura sustentável?
Mas a postura de ação rápida e enérgica
contra manifestantes que tentam se aproximar de instalações da Fifa será
mantida até o fim do mundial?
Segundo Neder, ela não deveria, pois o direito de manifestação pacífica
vem sendo prejudicado.
Já Tarlow afirmou que a estratégia vem sendo "eficaz" para o
objetivo de não criar publicidade negativa no exterior.
Segundo ele, o sucesso dos jogos do
mundial aliado a problemas internacionais também ajudam a tirar a atenção
internacional das questões sociais do Brasil.
"O Brasil perdeu muito prestígio por causa das manifestações antes
dos jogos da Copa do Mundo, mas durante a Copa a maior parte das pessoas está
prestando atenção nos jogos.”
“E também tem muitos problemas no mundo, problemas no Iraque, nos
Estados Unidos. Isso está ajudando a ocultar os problemas que há no Brasil”,
disse Tarlow.
Contudo, o cenário pode mudar
radicalmente se alguma força policial cometer um erro grave ou ocorrer uma
“tragédia” em um protesto. Por isso, segundo ele, a polícia tem que adotar
postura flexível.
Já para Tânia Pinc, pesquisadora da
Fundação Getúlio Vargas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a
postura das polícias pelo país pode estar relacionada às eleições de outubro.
Para ela, o que ocorre nos protestos é
resultado de uma interação dos grupos sociais, forças policiais e governos.
"Os governos nunca pautaram o direito de manifestação nas agendas,
sempre trataram como um assunto de segurança pública. A questão política sempre
era deixada em um plano secundário".
Segundo ela, o vandalismo provocado
pelos chamados black blocs cria justificativas para isso.
Assim, disse ela, a ineficiência dos
governos em resolver as questões levantadas nas manifestações faria com que
essas autoridades usem as polícias para postergar as decisões políticas.
A pesquisadora acredita que os temas
propostos pelos manifestantes dificilmente serão tratados antes das próximas
eleições, e a postura policial deve permanecer inalterada.
Manifestações têm perfil diferente
Segundo o especialista em segurança
Guaracy Mingardi, também membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, as
manifestações que vêm ocorrendo tem um perfil diferente dos protestos do ano
passado.
Ele afirmou que as polícias nunca
tiveram a preparação completa para diferenciar manifestantes pacíficos de black
blocs.
Mas nos atuais protestos, de menores
proporções, tornou-se mais fácil para os policiais diferenciar quem é quem.
Por causa disso, em sua opinião, os
protestos estariam se tornando menos violentos que os ocorridos no início de
junho de 2013.
"Há um número menor de manifestantes pacíficos e um número igual de
black blocs. Fica mais fácil para a polícia controlá-los".
Presença policial
Na última quinta-feira a opção feita
pela polícia de São Paulo foi diferente do que havia ocorrido desde o início da
Copa.
Os manifestantes do Movimento Passe
Livre divulgaram com antecedência o roteiro de sua manifestação - e ela não
passava pela Arena Corinthians.
Atendendo aos manifestantes, o governo
não enviou a Polícia Militar para acompanhar o protesto. Mas ao fim dele,
mascarados black blocs vandalizaram concessionárias e bancos.
A violência deu o alerta para a Fifa e
para o governo local - que prometeu que a polícia estará presente nos próximos
atos.
Resta saber se depois disso a repressão
rápida e enérgica da polícia realmente continuará como a principal tática.
Nesta segunda-feira, quando o Brasil enfrenta Camarões, novos protestos estão
previstos.
Fonte:http://www.defesanet.com.br/
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